domingo, 24 de julho de 2016

A caixinha cor-de-rosa

Dia desses, estava mexendo em uma caixinha de madeira em que guardo várias coisas: bibelôs, chaveiros que amigos trouxeram de lembrança de viagens, que ainda esperam por novas chaves, pen drives com fotos que congelaram momentos, pilhas novas e usadas e uma caixinha de som cor-de-rosa que eu havia ganhado e nunca tinha conseguido usar. Não por falta de tentativa.

Quando a trouxe para casa, fiquei alguns minutos analisando aquele objeto desconhecido. Mexi e remexi com pressa para que ela funcionasse logo, mas nada. Apertei todos os botões em combinações diferentes, conectei o cabo no celular, coloquei o carregador na tomada, tudo em vão. Pensei em pesquisar a marca e o modelo dela na internet para ver algum how-to, mas, para o meu azar, o símbolo da empresa era um desenho incompreensível e sem letra alguma que a identificasse.

Com a paciência esgotada, guardei a caixinha e nunca mais mexi naquele reprodutor de música fraudulento. Fiquei brava com o presente quebrado – imaginei que tivesse sido por isso que me deram. Cogitei até jogá-la no lixo, já que não teria utilidade. Mas deixei ela lá, parada, sem uso.

Um domingo tranquilo me colocou frente a frente com aquele objeto de frustração cor-de-rosa novamente. Encarei aquela caixinha por alguns segundos e comecei a revirá-la. Cabo conectado ao carregador, tomada, um LED acesso, configuração Bluetooth, emparelhar, Spotify, playlist Sophie Hunter e a música se fez. Ótima, alta, sem ruídos e uniforme em todos os ambientes da casa. Fiquei contente e me senti a pessoa mais esperta daquele m².

Lembrei do dia em que quis me desfazer da tal caixinha e o erro que isso teria sido. Pensei também em tudo aquilo que nos desfazemos por incompreensão, por não conseguirmos entender por falta de esforço, por falta de calma, por falta de respirar fundo e tentar de outra forma até conseguir. Nem nos damos o trabalho de tentar. Nos contentamos com um suspiro e o consolador “não deu certo”. Jogamos fora sem ao menos arriscar, sem ao menos nos dar o alento de ter tentado.

Quanto tudo aquilo que nos desfazemos poderia ter sido? Tantas pessoas, tantas relações, tantas oportunidades. Como tudo poderia ter funcionado se tivéssemos insistido? Não dá para saber, porque foi descartado. Covardes, é isso que somos muitas vezes. Ao contrário do que pensam, a derrota é o troféu dos valentes e a resignação, dos covardes. Ainda mais em uma época em que tudo foi feito para funcionar de primeira, para não decepcionar, para atender a todas expectativas. Tem que ser perfeito. Caso contrário, lixo; e que venha o próximo até ele ir para a reciclagem também na primeira falha.

A caixinha cor-de-rosa me deixou contente. Tocou a mesma playlist várias vezes seguidas para tirar o atraso do tempo em que ela ficou parada. E vai ter muitas outras para tocar agora que aprendi a usá-la.